[Opinión] Três leituras sobre o nacionalismo

I. O livro da arte:

Partimos de Kenneth Clark, quem a sua vez perseguia a um notável crítico da arte:

“Dixo Ruskin: “As grandes naçons escrevem as suas autobiografias em três manuscritos, o livro dos mortos, o livro das suas palavras e o livro da sua arte. Nenhum deles pode ser interpretado sem a leitura dos outros dous, mas dos três, o único fidedigno é o último”. Em linhas gerais, estou de acordo com isso. Se para dizer a verdade sobre a sociedade tivesse que escolher entre um discurso de um ministro e os edifícios que se erigiram durante o seu exercício, ficaria com os edifícios”.

Discrepo da orientaçom ao practicismo do nacionalismo majoritário. Nom só nom acredito nisso de que “os filósofos tenhem apenas interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questom, porém, é transformá-lo” senom que penso que os discursos dos nossos “ministrinhos” ainda mereceriam umha análisse semiótica que desvendasse tantos instrumentos de conformaçom dum imaginário limitado a quatro províncias espanholas, nas que o capitalismo é tam indiscutível como a lei da gravidade.

Com todo, podemos por umha vez esquecer-nos do livro dos mortos e do das palavras, e olhar para as linhas já escritas na recente autobiografia da nossa naçom. Se do livro da arte falamos, dentro do mecenazgo do governo atopamos umha ferida detrás da outra, agressons sobre o património natural e social, continuadas com veemência ou mesmo iniciadas sem muitas explicaçons. O que veremos dentro duns anos: mais quilómetros e quilómetros de estradas, aldeias desmoronadas por um trem que passará fugazmente para reforçar a nossa dependência, subsidiadas piscifactorias intensivas em toda a costa a benefício de transnacionais, muinhos de vento em cada monte, mais e mais eucaliptos a rematar a colonizaçom, umha inútil mas custosa mole “cultural” sempre a crescer ao carom da capital. Estes som os edifícios da política do espectáculo vazio e a arte destrutiva do nosso tempo, mas nem sequer podemos já imaginá-los como um livro: serám as páginas rotas que olharemos no futuro, mentres tentamos esquecer porquê as arrancávamos tam violentamente.

A obsessom por um mui determinado modelo de progresso –agora agudizada com a intensidade da crise- contrasta com a nula preocupaçom pola sorte das classes trabalhadoras, obscurecidas tanto em bonança como em tormenta. Eduardo Galeano advertia no seu popular ensaio sobre a história de América Latina, numha fórmula literária mas precissa, como nel é habitual, que o desenvolvimento é umha viagem com mais náufragos que navegantes. Salvando as distâncias, nom perseguimos o “progresso” que nos desenharom os poderossos: é ele o que nos acossa a nós. E aqui estamos, vítimas de tantos naufrágios provocados, dos que a língua –ao cabo, também umha questom de classe- serve como exemplo mais evidente.

II. O silêncio

Num desses contos que Franz Kafka condenara ao lume no seu testamento, o escritor checo sometia a umha particular revissom a passagem mais conhecida da segunda epopeia homérica, aquela que precissamente é tam grata para um histórico líder nacionalista.

No entanto, as sereias possuem um arma muito mais terrível que o canto: o seu silêncio. Nom sucedeu na verdade, mas é provável que alguém se tivesse salvado alguma vez dos seus cantos, mas nunca do seu silêncio. Nenhum sentimento terreal pode equiparar-se à vaidade de tê-las vencido mediante as próprias forças.


Com efeito, as terríveis sedutoras nom cantaram quando passou Ulisses; talvez porque acharam que àquele inimigo só podia feri-lo o silêncio, talvez porque o espetáculo de felicidade no rosto de Ulisses, quem só pensava em ceras e cadeias, lhes fixo esquecer toda cançom.

O jornal A Nosa Terra, esse caminho que vai desde as Irmandades da Fala às construtoras, nom é umha metáfora: é toda umha alegoria. É o mesmo percorrido que nos levou das classes populares aos empresários em clave de país; dum ecologismo incipiente –ainda que instrumental, cumha estratégia mais devedora do desgaste do Estado que dum auténtico discurso ecológico de nosso- ao desenvolvimentismo mais despido; dum modelo militante e organiçativo avançado no tempo aos delegados e ao reforço do controlo cupular, justo quando a esquerda caminha por toda a parte na direcçom inversa; e, por fim, da autodeterminaçom a um projecto com horizontes esvaídos, do qual nunca se ve o princípio nem o final.

Porém, nunca nos chamaram desde a terra de ninguém. Tam pronto como em 1967, Ernesto Ché Guevara afirmava que as burguesias autóctones perderam a sua capacidade de opossiçom ao imperialismo, ponhendo em dúvida que algumha vez o tiveram. Mais de três décadas despois, poderiamos parafrasear ao revolucionario argentino, com mais conhecimento de causa do que el: ou nacionalismo de esquerdas ou caricatura de nacionalismo. Numha sociedade galega enteira e profundamente transformada polo capitalismo, como depois dumha guerra, nom há lugar para um movimento soberanista digno de tal nome se nom é construído desde a esquerda. Nom som úteis já os mapas prévios à conflagraçom, agora que o capitalismo dissolve até a linguagem, agora que todas as fronteiras foram já modificadas. Só o silêncio das sereias podia ferir-nos mais do que os seus cantos.

III. Radicais como a realidade

Em 1917, quando o conflito que hoje chamamos primeira guerra mundial aterrorizava Europa, Lenin permanecia no exílio suíço, e adoitava visitar um café de Zurique frequentado por artistas, escritores e boémios. Ali conversou com o jovem poeta romeno Valeriu Marcu, quem escreveu um relato sobre o encontro anos despois:

-Entom Lenin dixo-me “Conheces o significado real desta guerra?”

-“Qual é?”, respondim

-“É óbvio”, replicou. “Um escravista, Alemanha, que só possue um cento de escravos, está loitando contra outro escravista, Inglaterra, que possue douscentos escravos, por umha distribuiçom “mais justa” dos escravos”

-“Como podes sentir ódio por esta guerra”, preguntei nesse momento, “se em princípio nom estás contra todas as guerras? Pensava que como un bolchevique eras realmente un pensador radical e rejeitavas qualquer concessom à ideia da guerra. Mas ao reconhecer a validez de algumhas das guerras, abres as portas de todas as oportunidades. Cada grupo pode atopar algumha justificaçom da guerra particular com a que concorda. Vejo que os jovens só podemos contar com nós próprios…”

Lenin escoitava atentamente, coa cabeça inclinada cara mim. Achegou a sua cadeira à minha. El deveu ter-se perguntado se continuar a falar com este moço ou nom. Eu, violentado dalgum jeito, permanecim calado.

-“A vossa determinaçom de confiar em vós próprios”, replicou finalmente Lenin, “é mui importante. Cada home deve confiar em si próprio. Ainda que também deveria escoitar o que a gente informada tem a dizer. Nom sei o radical que és, ou o radical que som eu. Seguro que nom som suficientemente radical. Nunca se é suficientemente radical; é dizer, deve-se intentar ser sempre tam radicais como a própria realidade”.

Num artigo de 2003, Xosé Manuel Beiras advertia já que “obxetivamente, o BNG leva feito o contrario do que constantemente é acusado de facer”, já que fora “un dique de contención da enxurrada de indignación popular que, sen íl, co moito que choveu ao longo destes vinte anos tería asolagado os vales e veigas nos que veranea todo o ano a perguiceira e alienada clase política deste país. Represa e canle de conducción de enerxías populares rebeldes á “doma e castración” que segue a aplicar o poder á cidadanía galega”.

Porém, se a direcçom do BNG nom ocultou a mao durante os últimos anos foi porque pensava que nom lhe ficavam já pedras para atirar, nem contra o patronato que se sabe o único dono do país nem contra a estrutura política e jurídica que nos encarcera a um Estado-naçom impossível, fundamentado em mui existentes explotaçons nacionais e de classe.

Mas nom foi esta a primeira força do mundo que aspirou a vender um projecto de transformaçom social a cámbio da respetabilidade do sistema. Em 1879, tam só tres décadas depois da publicaçom luminosa do Manifesto do Partido Comunista, Karl Marx reprochava aos socialdemocratas alemaos que negassem renunciar ao seu programa com a excusa de adiar a sua realizaçom por tempo indefinido, “para deixá-lo em herdança aos filhos e aos netos”, mentres dedicavam forças e energias a “futilidades sem conto e a um remendo misserável do regime capitalista, para dar a impressom de que algo se fai”, e “sem asustar ao mesmo tempo a burguesia”.

Volvamos às rochas de hoje. A capitulaçom nom apanhou os aplausos das urnas, senom ao contrário: umha vez abandonamos os seixos que tanto nos custara acumular no nosso modesto milhadoiro, as “pedras de papel” das que falava Engels começaram também a dessaparecer, num ciclo que quiçá ainda nom rematara. Contra todo raciocínio, o declínio eleitoral nom levou até o de agora ao questionamento do rumo, já que o debate foi abruptamente cercenado, nomeadamente a partir da entrada no governo, e a desnaturalizaçom da organizaçom bateu umha e outra vez contra a história, contra a lógica e ainda contra o país, sem atopar quebra-mares adequados, a pesar do ingente esforço dedicado à sua construçom desde possiçons minoritárias.

Pode que o pior esteja ainda a chegar. Há quem fala já dos meios de comunicaçom –dos mesmos que louvavam e subsidiaram generossamente com fundos públicos-, quem sinalou a responsabilidade dos movimentos sociais críticos –cujas demandas esqueceram e cujas mobilizaçons desprezaram-, e haverá quem sugira que forom atrevidos de mais, mesmo quem chegará a sinalar os dedos que apontavam a lua –mesmo contra este artigo- e criticar aos sectores que exercerom a crítica interna com constáncia e respeito, aos que figerom ouvídos xurdos. Mas as fendas estám noutro lugar.

Porém, assumiremos algum dia que sempre devemos perguntar-nos se de verdade somos já tam radicais como de facto o é a realidade, para começar a acumular todas as forças necessárias e ampliar a basse social que sabe que a opossiçom ao conjunto do sistema nom é o ponto de chegada, senom o de partida. Há outros roteiros, pero todos estám neste.

José Emílio Vicente é membro na Mesa Nacional de Isca!

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